Em 2016, o Brasil assumiu o compromisso de restaurar e reflorestar 12 milhões de hectares de paisagens florestais. Isso representa um esforço que gera benefícios ambientais, econômicos e sociais, auxiliando na mitigação das mudanças climáticas, na consolidação do desenvolvimento sustentável e no aumento da produtividade e da renda dos trabalhadores e produtores, através, por exemplo, da venda de produtos florestais e o crescimento de uma economia de baixo carbono fortalecida para toda a sociedade. Um importante aspecto do movimento que vem se estruturando há anos é a oportunidade de incorporar a perspectiva de gênero no planejamento e desenvolvimento de ações de restauração. O Relatório do Desenvolvimento Humano de 2011, que incluiu 65 países em desenvolvimento e 25 países desenvolvidos, demonstra que aumentar a representação das mulheres em processos de governança cria benefícios ambientais e aumenta a qualidade ambiental. Mas é preciso ainda mais para superar a desigualdade de gênero: além do aumento da presença de mulheres, a natureza da participação delas é importante.

O envolvimento de diversos setores é essencial no processo de restauração de das paisagens florestais. Articulações que buscam envolver pesquisadores, especialistas e líderes do setor produtivo, como o Pacto Pela Restauração da Mata Atlântica (Pacto), a Coalizão Clima, Florestas e Agricultura e a mais recente Aliança Pela Restauração na Amazônia, são exemplos dessa contribuição para dar escala às intervenções de restauração e reflorestamento no país.

Em zonas rurais, as populações dependem diretamente dos ecossistemas para proteção de nascentes, manutenção da qualidade dos solos e produção agropecuária e florestal. No campo e nas comunidades tradicionais e indígenas, os papéis de gênero são tradicionalmente identificados e claramente divididos em relação às florestas. Mulheres e homens diferem em como usam as florestas, que produtos florestais escolhem e nos benefícios que recebem.


Mulheres em Juruti. (Foto: Nick Elmoor/WRI Brasil)

No ranking global de desigualdade de gênero do Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD), o Brasil ocupa a 79º posição de um total de 188 países. De acordo com o último recorte de todos os estabelecimentos agropecuários brasileiros realizado em 2006 pelo IBGE, apenas 13% das propriedades rurais são comandadas por mulheres. E do total das 650 mil mulheres responsáveis por estabelecimentos rurais, 6% estão economicamente engajadas com a produção florestal (nativas e plantadas). Mesmo em maior número, apenas 3% dos proprietários rurais têm atividades florestais. A desigualdade de gênero manifestada no acesso desigual aos recursos e nas instâncias de decisão pode prejudicar o meio ambiente e impedir o desenvolvimento humano. A degradação da floresta, a poluição do ar e outras ações de degradação ambiental são maiores quando a desigualdade de gênero é alta.

Por outro lado, os países com maior representação parlamentar feminina são mais propensos a criar áreas de reservas naturais e a ratificar acordos globais ligados ao meio ambiente.

Existe uma grande oportunidade para ampliar o envolvimento de mulheres na produção rural e nas atividades econômicas relacionadas à produção florestal. Segundo uma das cartilhas elaboradas pelo Grupo de Trabalho Diversidade do Pacto, com apoio da União Internacional pela Conservação da Natureza, a busca e o alcance da equidade de gênero podem gerar um incremento de US$ 12 trilhões na economia global. Inserindo o tema de gênero nos projetos de florestas e restauração de paisagens, é possível garantir que os benefícios da promoção de uma economia florestal sejam compartilhados por todos os envolvidos na condução das propriedades rurais e na cadeia econômica de produção florestal. As mulheres brasileiras rurais, como milhões de outras mulheres ao redor do mundo, têm plena competência e o conhecimento para tomar decisões sobre como gerenciar recursos naturais de maneiras que beneficiarão todos.

Entre 2002 e 2012, houve um aumento significativo de mulheres empreendedoras no Brasil. O Anuário das Mulheres Empreendedores e Trabalhadoras em Micro e Pequenas Empresas registrou aumento em cada uma das cinco regiões do país, com o Norte na liderança, onde houve uma expansão de 78% do número de empreendedoras.

Juruti e Pintadas

No Brasil, as mulheres já se destacam na coleta de sementes e criação e manutenção de viveiros e comercialização de mudas, representando 50% da força de trabalho na produção de mudas e sementes. Elas também estão envolvidas na produção de plantas com fins medicinais, alimentícios e cosméticos, e podem ampliar seu papel na economia rural, se devidamente empoderadas para tanto. Um projeto em Juruti, Pará, por exemplo, vem construindo uma estratégia de engajamento de mulheres de comunidades rurais em atividades de restauração florestal que aborde a questão de gênero, contribuindo para a melhoria da renda e a participação das mulheres nas esferas de decisão.

O WRI Brasil está trabalhando com essas mulheres já engajadas na coleta de sementes e produção de mudas para potencializar oportunidades para comercialização e aumento de renda, apoiando o acesso a treinamento e informação. Mulheres da comunidade Nova Galileia, em Juruti, contaram sobre as atividades que estão desenvolvendo e os desafios para continuar a trabalhar na cadeia da restauração florestal.

Já no interior da Bahia, mulheres do município de Pintadas estão se destacando como agentes de transformação social no campo e na floresta. Ao longo dos últimos cinco anos, a economia local tem ganhado força pela criação de uma fábrica de processamento de frutas vinculada à cooperativa que está sob a liderança de mulheres. Com apoio de parceiros, incluindo o WRI Brasil, a implementação de práticas agroecológicas na região do município de Pintadas tem aumentado a resiliência da agricultura a baixa disponibilidade hídrica e criado novas oportunidades econômicas, como a comercialização e a venda das polpas produzidas localmente.

Está na hora de fomentar e investir nas mulheres e meninas que vivem nas áreas rurais como agentes de transformação social, econômica e ambiental. Práticas como coleta de sementes, produção de mudas e implementação de atividades produtivas que envolvam agroecologia trazem benefícios e oportunidades não só econômicas, mas também ambientais. São práticas que promovem a restauração de florestas, conservação de paisagens e aumentam a resiliência a impactos climáticos como secas.

Já que 6% de todas as 650 mil mulheres responsáveis por estabelecimentos rurais são economicamente engajadas com a produção florestal, existe um potencial significativo de investir e aumentar ainda mais a participação delas em cadeias produtivas florestais. Investir em mulheres e meninas no campo significa investir em uma economia florestal de baixo carbono e resiliente.

O WRI Brasil está desenvolvendo projetos para incentivar a restauração de paisagens e florestas nos diversos biomas brasileiros. Práticas agroflorestais que utilizam espécies nativas da flora e, ao mesmo tempo, geram renda para as produtoras e produtores rurais resultam em sistemas produtivos resilientes ao clima e se tornam uma eficiente estratégia para a conservação da natureza.


Acesse aqui a coleção de cinco cartilhas “Semeando Equidade”, elaboradas pelo Pacto Pela Restauração da Mata Atlântica. O projeto oferece perspectivas de gênero na restauração de paisagens florestais e contou com a colaboração de mulheres especialistas nos temas tratados. Entre as entrevistadas, estão Rachel Biderman, diretora executiva do WRI Brasil, e Mariana Oliveira, analista de pesquisa e especialista em gênero do WRI Brasil.