Leia a entrevista com Celio Bouzada, da BHTRANS e João Domingos Azevedo, do Instituto Pelópidas Silveira (Recife), após missão técnica para conhecer iniciativas inovadoras de cidades do Reino Unido.

Depois de conhecermos várias iniciativas de smart cities, para você, o que são cidades inteligentes?

João - Cidades inteligentes são cidades que entregam o serviço público que a sociedade demanda de forma inteligente e eficiente e que minimizam o excessivo gasto de energia e financeiro. As cidades, com toda a inovação tecnológica, têm evoluído para se utilizarem cada vez mais de dados e de sensores, mas para ser uma cidade inteligente ela não precisa necessariamente disso. Ela pode contar com os dados e a com a tecnologia e ter grandes benefícios. A base de tudo é ter um planejamento urbano integrado e as soluções devem ser integradas também.

Celio - Cidades inteligentes são aquelas que usam a tecnologia para prover bons serviços para os seus cidadãos.

João Domingos Azevedo, do Instituto Pelópidas Silveira (Foto: Caroline Donatti/WRI Brasil Cidades Sustentáveis)

Na sua área de atuação, qual é o aprendizado que você leva dessa missão técnica?

João - Não existe planejamento urbano sem informação. Estamos trabalhando sobre o território, e essa informação precisa ser geoespacializada. É fundamental que a gente fortaleça a coleta, o processamento e, principalmente, a utilização desses dados. É um caminho sem volta e que precisamos fortalecer cada vez mais no Brasil. Um dos principais problemas, não só do Recife mas de toda grande cidade, está na mobilidade, mas ela não pode ser enfrentada de forma isolada. O grande aprendizado que a gente leva dessa viagem é a questão do planejamento urbano integrado, dos serviços públicos integrados. A gente pode ver, por exemplo, o sistema de iluminação inteligente. As prefeituras, em geral, possuem uma rede própria de energia que alimenta os postos de iluminação. Estes postes podem receber sensores de variados tipos que vão poder permitir um melhor serviço de iluminação pública. Assim, você fica sabendo se a luminária queimou ou não por uma rede wireless. Você conecta o sensor para que ele tenha uma alimentação de energia, mas ele cria e se comunica com uma rede sem fio. É muito importante que a gente faça maiores investimentos em um controle semafórico para a gestão de um trânsito mais inteligente, que tenha condições de reação e que seja menos estático. São caminhos que a gente precisa atacar mais diretamente.

Celio - A BHTRANS hoje já tem muita tecnologia aplicada. Nós temos um sistema de bilhetagem, de informação dos usuários com painéis nos pontos. Todos os nossos semáforos já são interligados, em tempo real, temos painéis integrados, usamos microsimulação. O que nós aprendemos aqui é que a gente pode usar esses dados de forma mais inteligente. Toda visita, toda reunião a gente sempre aprende um pouco, até com pessoas que não tem os mesmos sistemas que a gente.

Celio Bouzada, da BHTRANS (Foto: Caroline Donatti/WRI Brasil Cidades Sustentáveis)

De todas as iniciativas apresentadas nestes cinco dias, quais são os conceitos ou as ideias de projetos que você acha que podem ser aplicados na sua cidade?

João - No que diz respeito aos sensores, que podem ser aplicados para várias atividades, o que me tocou mais foram os sensores para coleta do lixo. Isso precisa ser avaliado do ponto de vista dos contratos e da gestão da coleta, mas ela precisa ser mais inteligente. O caminhão não precisa passar onde não tem lixo. Recife está muito sujeita a chuva e a pontos de alagamento - e os sensores poderiam constribuir nesse aspecto também. Muita gente questiona os investimentos em cidades inteligentes e tecnologia quando as cidades, muitas vezes, têm tantas outras demandas, como saúde e educação. É preciso entender que a inteligência e a tecnologia não são um custo a mais, são um investimento que gera retornos – como mais economia e eficiência na prestação de serviços públicos. E essa economia pode propiciar recursos investimentos em outras áreas e necessidades das cidades. Isso é pensar em smart cities.

Celio -  Eles têm usado muitos sensores e eu acredito que esse tipo de aplicação inteligente pode ser útil em diversas áreas da cidade, inclusive para a mobilidade.

Quais são as principais dificuldades que você enxerga no incentivo de cidades inteligentes no Brasil?

João - As barreiras principais são da ordem da governança, em vários níveis. No caso de Recife, como a cidade é metropolitana, a articulação com os demais municípios também é uma dificuldade.  Problemas de transporte, lixo e água não se resolvem no município. Temos o desafio de implantar a governança metropolitana a partir do Estatuto da Metrópole. Ainda temos muitas pendências ou muitas dificuldades para poder vencer essa etapa. Internamente no município, o desafio é conseguir de fato uma visão integrada e holística do todo e não dos sistemas e das caixas individualizadas. O planejamento integrado, as consequências e os benefícios que cada investimento traz, não só para a aplicação direta mas para áreas indiretas. Existe um processo de convencimento e a gente volta para casa com o compromisso de fazer e esperamos que a gente seja bem-sucedido.

Celio - Essa é a segunda rodada no Reino Unido. Nós fomos convidados para participar de um diagnóstico para os sistemas de BRT e o que eu vi no diagnóstico é que temos muita informação e tecnologia aplicada. Só que essas informações e esses dados não estavam bem organizados e bem disponíveis nem para tomada de decisão e nem para população. Então precisamos melhorar a qualidade, a melhoria contínua do trabalho. Nós temos muita informação, temos boas ideias de aplicações para seguir como exemplo.

A missão técnica ao Reino Unido é parte do projeto Cidades + inteligentes no Brasil, realizada em parceria entre WRI Brasil Cidades Sustentáveis e Future Cities Catapult e conta com o apoio da Embaixada Britânica.  Celio Bouzada, da BHTRANS; Eleoterio Codato, do Ministério das Cidades, João Domingos Azevedo, do Instituto Pelópidas Silveira (Recife), Matheus Ortega, gerente de infraestrutura do Prosperity Fund da Embaixada Britânica e Guilherme Johnson, da Future Cities Catapult,  participaram de uma viagem de cinco dias ao Reino Unido  para conhecer boas ideias de cidades inteligentes que podem inspirar os municípios brasileiros a serem mais inovadores.

Leia mais sobre a missão:

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